Newsletter da 300Noise #4 - abril infinito
Met Gala, pen drives recheados de música, lançamentos quentes e as batalhas contra o algoritmo.
Meus amigos, como somos sinceros com vocês, já avisamos: abril foi um mês de derrotas algorítmicas. Em especial para o nosso querido e amado Instagram da 300noise, que será alvo de um novo experimento a partir deste mês de maio. [Contamos, direção?]
Dito isso, apesar do nosso cansaço em trabalhar gratuitamente para o Mark Zuckerberg, que destrata nossa labuta, seguimos em riste tentando trazer o mais sublime conteúdo sobre mercado musical para vocês. Nesta newsletter, vamos abordar cerimônias de gala, pen drives, e, claro, o tão aguardado disco novo do Mars Volta. E juramos que no fim, tudo ou quase tudo, vai fazer sentido.
No início de abril, tivemos as tarifas de Donald Trump, que abalaram o mundo e o mercado musical também. Depois, o Lollapalooza deu conta de uma série de debates interessantes a partir do nosso levantamento de dados, agora, a febre dos listening bars na capital paulista. Uma série de batalhas impensáveis, umas mais duras de explicar e outras mais duras de suportar. Mas chegamos ao fim do mês, de olho no mais importante dos feriados: o Dia do Trabalhador. Com fé em um maio de recuperação, alegria e alto astral. E o show da Gaga, claro.
Um forte abraço, boa leitura e um beijo da 300noise em vosso coração. A, mais uma coisa… podemos pedir seu apoio? Se gosta do nosso conteúdo, considere se inscrever para receber dados sobre o mercado da música, análises exclusivas e estar por dentro do estúdio cultural que segue desafiando a lógica do mercado.
O MET Gala 2025 e a Sonoridade do Dandismo Negro
O tema do MET Gala 2025 é "Superfine: Tailoring Black Style" e mesmo que sua praia não seja a moda, esse ano o evento trabalha algo que a música conhece intimamente desde os tempos mais primórdios: a construção da imagem é extensão da criação artística. A curadoria inspirada no trabalho de Monica L. Miller sobre o dandismo negro explora essa tradição através de nomes como André 3000, Duke Ellington e até Pharrell Williams, diretor criativo da Louis Vuitton e co-host do evento esse ano.
O MET Gala consolida uma tendência de mercado que observamos em ascensão: a sofisticação visual como linguagem artística personalizada. Isso funciona tanto para A$AP Rocky lançando o Mostro Disccords com a Puma quanto para Tyler the Creator incorporando a Golf Le Fleur* dentro da própria discografia. A coerência visual é tão crucial quanto uma coesão sonora.
O dandismo negro é estratégia de posicionamento de mercado. A proposta que passeia pelos porões novaiorquinos de Harlem que eclodiram o jazz bebop nos anos 40, mas também remete à origem histórica do costume das sociedades escravocratas de vestir pessoas escravizadas de maneira extravagante como símbolo de poder. A personificação do dandismo negro está na moda como ferramenta de autonomia dentro da sociedade.
O MET Gala 2025 dialoga com o tema através de figuras musicais justamente pela conexão histórica envolvendo a música negra e a evolução da indústria da moda acompanhando esse processo. O tema desse ano certamente evocará o cruzamento entre jazz e moda que Miles Davis construiu, o afrocentrismo de Erykah Badu, ou a extravagância e personalização de Prince.
Para quem se interessa ou trabalha com música, o evento serve como termômetro. Não só para entender a dinâmica entre marcas e artistas, mas para mirar direções criativas e inspirações culturais que estão indo ao encontro do mercado, ou melhor, que o mercado está indo ao encontro, claro.
Desertos de streaming - uma crônica de um agente da 300noise em terras catarinas
A vida do cosmopolita médio paulistano parece, nesta altura do campeonato, passar obrigatoriamente por um aplicativo de streaming musical. Seja o Spotify, o Deezer, ou mesmo o Youtube (sem ser o Music, mas ele conta também), é difícil pensar no consumo de música individualizado que não passe por essas ferramentas — até mesmo antes de comprar um vinil —, e, em última instância, por uma conexão com a internet.
Mas em uma recente passagem pelas terras de Santa Catarina, tive a oportunidade de passar por duas formas de consumo de música individualizadas e digitais que podem abrir chaves de pensamento para pensar distribuição dos nossos amados fonogramas: as rádios — que seguem extremamente populares pelas bandas catarinenses — e os pen drives.
A cultura dos pen drives está em nosso radar da 300 há tempos, mas eu nunca tinha parado para perceber como a minha família e adjacências são dependentes deste método que muitos consideram arcaico para o consumo de música. Minha tia, por exemplo, tinha alguns, para ouvir no carro. Meu tio, tinha um específico para ouvir no churrasco. E até mesmo pessoas mais jovens os detinham ali.
O motivo não é falta de conexão necessariamente, mas praticidade. Você enfia o pen drive na televisão, no rádio do carro ou na caixinha de som (que sim, tem bluetooth, mas ele é subutilizado) e, numa lógica de usabilidade, é simples: aperte um botão e tem música tocando. Você não tem que criar conta, pagar por um plano, aprender a usar uma nova interface, etc. É só… ouvir música. O mesmo com o rádio. Você liga e pá, pum, a música está tocando.
Ambas as formas possuem duas limitações: podem conter propagandas, e, claro, tem um cardápio limitado e pouco personalizado de canções. Por outro lado, você paga só uma vez por aquilo, conhece o material a fundo e não vende seus dados em troca de um single bunda de trap aparecendo na tua home todo dia.
Mas esta popularidade me fez pensar em uma série de questões que podem ajudar a pensar fora da lógica do streaming. Segundo a YouGov, cerca de 60% da população brasileira ouve música através das plataformas. Poxa, é bastante gente. Mas isso significa que tem 40% relativamente alheias ao principal foco da distribuição de música no Brasil.
Pessoas estas que talvez estejam até interessadas em novos sons e novas descobertas, mas que podem não ter um streaming por uma série de motivos, que vão desde a falta de cartão de crédito à preguiça de ter que se adaptar a uma usabilidade desnecessária.
Quando batemos na tecla da música física aqui, acho que também queremos bater na tecla de uma música mais democratizada e acessível a quase metade do Brasil que se recusou, até o momento, a se streamingzar. Quando eu trabalhei com o Bradesco, existia um lema de “aumentar a bancarização do Brasileiro”. Se essa deu certo por uma série de fatores, mas em especial ferramentas públicas, como o pix e o auxílio emergencial, a streamingzação não conta com o benefício da mão dura do estado. Pelo contrário, ouvir música, apesar de ser necessidade, é questão de afeto. E às vezes é preciso pensar nestes afetos para pensar sua distribuição.
Saia de algum lugar e vá fazer alguma coisa, como por exemplo…
Assistir um filme: Pink Floyd – Live at Pompeii
Remasterizado e disponível nos cinemas nacionais em IMAX. Nem todas as bandas podem gravar um álbum ao vivo na cidade de Pompeia, mas em 1971 o Pink Floyd recebeu alvará para fechar o anfiteatro da cidade histórica por seis dias e gravar uma apresentação que contrastava com mosaicos e ruínas. Um concerto sem público, ou melhor, com um público mumificado em cinzas de vulcão. Eu não perderia a chance de ver a versão de Echoes desse filme nas telonas...
Se Pink Floyd for muito normal para você: Björk: Cornucopia
Com uma estreia mundial no dia 7 de maio, você será transportado para um concerto da cantora islandesa em uma imersão sonora e visual daquelas. Explore o reino fungi com uma orquestra e coral. Vamos deixae essa matéria aqui para você saber mais.
Ouvir uma rádio (em qualquer lugar do mundo): Radio Garden
Por falar em formas diferentes de ouvir música e para carinhosamente obrigar você a ouvir coisas que não estão no streaming... recomendamos que você perca horas, dias, semanas, talvez, no Radio Garden. Um site que conta com mais de trinta e três mil rádios do mundo todo. Quer conhecer mais sobre Artistas da Zâmbia? Quer ver o papo que rola na programação de uma rádio de Mumbai na Índia? Vai pro Radio Garden.
Conferir os: Lançamentos Nacionais em K7
Nas últimas semanas falamos sobre as fitas K7, o início da pirataria musical e como essa tecnologia acabou revigorando e ampliando a música underground e possibilitando a criação de comunidades. Nada mais justo do que falar sobre alguns projetos de artistas nacionais que tiveram lançamentos físicos em fita K7 nesse último mês. Não criamos moda, analisamos o cenário em que ela é desenvolvida!
Terraplana – Natural
Black Pantera – Perpétuo
Can Sad – Escatologia
Zine Design Musical do Brasil ─ 2ª edição
A 300noise fez uma nova impressão da zine DESIGN MUSICAL DO BRASIL.
Restam 10 cópias físicas do projeto gráfico que celebra e preserva logos de selos e gravadoras do Brasil durante o século passado. Nosso projeto envolveu busca por endereços desativados, digitalização de artes diretamente de discos de vinil e a descoberta de muito material perdido no fundo de sebos e armazéns.
Você pode pedir a sua por aqui!
Claro, disponibilizamos a versão digital em nosso site para você dar uma checada e compartilhar com geral.
Se programe para o show de Ca7riel e Paco Amoroso
Fizemos um post para falar da necessidade da integração da música latina e as produtoras nos ouviram (ou talvez tenham reparado que uma atração que estacionou no Lollapalooza Brasil depois do anúncio do lineup chamou mais atenção do que imaginavam). Na divulgação de um EP jazzudo, bacanérrimo e com uma narrativa super interessante, o duo argentino vem para o Rio e para São Paulo em Setembro. Ingressos a partir de 90 reais.
Por último, os sons
Backxwash - Only Dust Remains
Ashanti Mutinta, uma artista com raízes na Zâmbia e no Canadá, entrega não só um dos trabalhos mais criativos do rap desse ano, como um disco que abocanha o ouvinte com temas introspectivos, espiritualidade e uma atmosfera com diferentes camadas. Esse não é um trabalho tão ‘industrial’ e certamente é mais tranquilo que seu antecessor. Mas a qualidade... *chef's kiss*
Rachel Reis – Divina Casca
Grande lançamento nacional. Rachel Reis entrega um trabalho ainda mais sólido do que o disco anterior ‘Meu Esquema’. Um álbum para se prender nos detalhes e na construção de algumas faixas, como ‘O Maior Evento da Sua Vida’. Os elementos de arrocha e pagodão fluem bem até quando a faixa estaciona no pop. Um trabalho que cabe Don L, BaianaSystem e Psirico.
The Mars Volta – Lucro Sucio; Los Ojos del Vacio
Ignorando o ST, esse disco sim se parece como uma continuação da trajetória da banda que já se inclinava para guitarras minimalistas e experimentação eletrônica. Agora temos mais space rock e um jazz que ganha espaço entre muito vocal e linhas de baixo finíssimas.
Jane Remover – Revengeseekerz
Sabe aquele disco que dá o que falar? Então. Jane Remover entrega um trabalho impressionante e explosivo. Tem industrial, tem hyperpop, tem hip hop, tem EDM. Cada faixa acaba deixando o ouvinte ainda mais incerto do que vai vir. A certeza é só uma: você vai se surpreender com as infinitas camadas, detalhes, sons, barulhos, influências e caos. Discão.
Natalia Lafourcade – Cancionera
A número 1 da 300noise de 2022 retorna com um disco de tocar o fundo da alma. Usando mais espaço para imersão, construindo melodias mais complexas e referenciando a música mexicana, seu folclore, e se aprofundando ainda mais dentro da rancheira, do bolero e son jarocho. Lafourcade colhe frutos mais maduros e mostra que tem muita lenha pra queimar.
Faltou mencionar algum lançamento?
E, por fim:
Gostou deste mês mais histórico da 300Noise? Acreditamos piamente que todo mundo tem direito de ficar um pouquinho nostálgico de vez em quando. Especialmente para se revoltar com o presente.
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